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quarta-feira, 7 de abril de 2010

Um Rio de coisas


Batalhaste tanto na noite anterior, lutando severamente contra o cansaço, que acordou já tarde com fortes dores nos membros superiores. Pretendia ter feito tanta coisa durante aquela longa noite, mas foi incapaz de levantar-se da cama e sentar na cadeira próxima e confortável de seu quarto. O frio a deixa pensativa, cheia de vontades, apaixonada por qualquer inseto que nela repousasse e, triste também. Triste porque sabe que lá fora a chuva cai ferozmente inundando parte da cidade, impossibilitando-a e negando-lhe o abraço quente, triste porque esse frio que antes lhe encantava agora é tão assustador quanto um animal selvagem. Sozinha o tempo multiplica-se inúmeras vezes, suas mãos gelam e a boa resseca, o lápis surge como um refúgio no sofá, um gato dormindo e um edredom cobrindo as pernas.


Compreende que nem sempre aquela necessidade pode ser suprida, aniquilada do seu peito, a vontade vai aumentando, a saudade começa até a brotar, enraíza-se com força e vitalidade e vai lhe roubando as energias, vai consumindo também a mais profunda gota de vaidade e pouca coisa sobra. O que resta agora é o suficiente para mais alguns dias, arrastados e que serão apenas mais uns poucos dias daquela freqüente nostalgia.


E recomeça a ventania vinda sabe-se lá de onde, que faz balançar a persiana colorida, criando naquela ambiente que só tocam músicas baixas, a fim de não incomodar os outros, uma mistura desagradável de ruídos e batidas. Na cadeira, de costas pra janela, sem se importar com aquela barulheira, desenha. Separa no canto o que foi prometido a um amigo distante, desenhos bonitos e frases. Os outros papéis ela faz questão de datar, e mais do que isso, faz questão de ter algum símbolo ou mero rabisco correspondente a sua necessidade.

Um banho rápido, um copo d’água, dois comprimidos. A foto em cima dos livros, colocada ao lado das folhas amareladas que lhe alegram o olhar, que ela relê e não cansa de observar os traços das letras e dos rabiscos (...)


Desliga a TV e retorna à mesa, uma bolinha verde e um sorriso, aquele sorrisinho que faz quando está num sono bom, que ela insiste em não se esquecer nem das batidas mansas do coração nem das freadas do carro, dos gostos, da pele, do beijo (...)

“No entanto, ela valia, para ele, como ele para ela, mais que o mundo inteiro.”

E sorri feliz, vivamente, sem medos, sem dúvidas, sem ninguém pra sorrir com ela, mas sorri.

Um comentário:

Hebert disse...

Não consigo cansar de ler isso(...)

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