Dizem que a gente tem o que precisa. Não o que a gente quer. Tudo bem. Eu não preciso de muito. Eu não quero muito. Eu quero mais. Mais paz. Mais saúde.Mais dinheiro. Mais poesia. Mais verdade. Mais harmonia. Mais noites bem dormidas. Mais noites em claro. Mais eu. Mais você. Mais sorrisos, beijos e aquela rima grudada na boca. Eu quero nós. Mais nós. Grudados. Enrolados. Amarrados. Jogados no tapete da sala. Nós que não atam nem desatam. Eu quero pouco e quero mais. Quero você. Quero eu. Quero domingos de manhã. Quero cama desarrumada, lençol, café e travesseiro. Quero seu beijo. Quero seu cheiro. Quero aquele olhar que não cansa, o desejo que escorre pela boca e o minuto no segundo seguinte: nada é muito quando é demais.
Algum dia em qualquer parte, em qualquer lugar indefectivelmente te encontrarás a ti mesmo, e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga de tuas horas.
Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, espararei quanto tempo for preciso.
As coisas tristíssimas vão desaparecer quando soar a trombeta. Levantaremos como deuses, com a beleza das coisas que nunca pecaram, como árvores, como pedras, exatos e dignos de amor.
O som mais agradável aos ouvidos, a harmonia mais relaxante à alma, o timbre mais ideal ao espírito. Chega ao corpo com a mais potente energia, capaz de elevar, magistralmente, todo e qualquer ser, acredito que vivo ou inanimado, de maneira sutil e completa. A voz de quem se ama sempre será ouvida, mesmo que distante.
Depois sairias caminhando devagar, vencendo a praça, voltando ao caminho de cascalho. Mas desta vez pisarias muito suave. Seria leve o toque de teus pés, seria verde o teu olhar no gesto de virar a cabeça para ver o mar, seriam mansos os teus movimentos em direção ao ponto de fuga onde mergulharia a rua. Na esquina olharias pela segunda vez para trás e veria um caminho, uma praça e o mar. Um caminho, uma praça e o mar. E no meio da praça, uma moça. Bancos de mármore, árvores sujas, canteiros vazios, nenhum lago, uma estátua devastada e, muito recuada, uma moça. Sem movimentos, uma moça.
Ele sentiu o prazer de voar, caiu do cavalo. Não caiu, flutuou. Apenas flutuou, sentiu a alma, a essência, era como o paraíso, "mas ele existe?" não sabia. Não sabia se era certo, errado, mas existia, ele sentia, se é bom ou não não se sabe ao certo, mas ele girava, e quanto mais ele girava, mais ele queria girar. Ele estava fazendo o que queria, e o que ele mais queria fazer naquele momento, girar no espaço gradativo de sua alma. Ele se sentiu bem pela primeira vez na vida. Para ele não fazia diferença viver na terra, amar no céu ou queimar no inferno, ele se sentia bem.
(...) e nós dois, sempre abraçados, nos inteiriçamos numa só mole informe, sonora e maciça, onde as nossas veias primitivas, já secas e tolhidas, formavam sulcos ferruginosos, feitos como que do nosso velho sangue petrificado. E, século a século, a sensibilidade foi-se-nos perdendo numa sombria indiferença de rocha. E, século a século, fomos de grés, de cisto, ao supremo estado de cristalização. E vivemos, vivemos, e vivemos, até que a lama que nos cercava principiou a dissolver-se numa substância líquida, que tendia a fazer-se gasosa e a desagregar-se, perdendo o seu centro de equilíbrio; uma gaseificação geral, como devia ter sido antes do primeiro matrimônio entre as duas primeiras moléculas que se encontraram e se uniram e se fecundaram, para começar a interminável cadeia da vida, desde o ar atmosférico até ao sílex, desde o eozoon até ao bípede.
Chegue bem perto de mim. Me olhe, me toque, me diga qualquer coisa. Ou não diga nada, mas chegue mais perto. Não seja idiota, não deixe isso se perder, virar poeira, virar nada. Daqui há pouco você vai crescer e achar tudo isso ridículo. Antes que tudo se perca, enquanto ainda posso dizer sim, por favor, chegue mais perto
A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o visitante sentou na areia da praia e disse: “Não há mais o que ver”, saiba que não era assim. O fim de uma viagem é apenas o começo de outra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite, com o sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para repetir e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre.